Aos treze anos sofri um misterioso acidente, não me recordo
como aconteceu, sei que fui atropelada em frente a minha casa ao atravessar a
rua, aos 16 tive o primeiro desmaio com semi-perda de consciência que foi
atribuída a uma hipoglicemia após vômitos, aos 17 uma perda de consciência no
laboratório de química do colégio por razões hoje conhecidas como sintomas
prondrômicos (que antecedem ou denunciam uma Síncope Neurocardiogênica), aos 18
uma perda total de consciência após exercício físico e aos 19 os desmaios se
tornaram cada vez mais frequentes.
Os traumas por queda são considerados o que há de mais
perigoso no meu quadro, e imaginem que com a frequência deles começou-se então uma
verdadeira maratona para diagnosticar a verdadeira causa.
Dois anos de visitas médicas a clínicos, neurologistas, psiquiatraS, curiosos, curandeiros, médiuns e nada de conclusivo, médicos mentem,
na falta de vergonha na cara de admitirem o desconhecimento do meu quadro.
Olha, o poder de persuasão dos médicos diante de uma
paciente desesperada por respostas te levam a tentar de um tudo. Depois de
tanto tentar sem resposta e de todas as sequelas e efeitos colaterais que
vários medicamentos de vários tipos diferentes de diagnóstico trouxeram, me
fizeram questionar e perceber erros e uma enorme perda de tempo, eu não tinha e
ainda não tenho total controle sobre minhas crises, mas também notava que nenhuma
doença psicossomática e tratamentos sugeridos se encaixavam. O bom de tudo isso
é hoje ter muito mais conhecimento adquirido ao longo dos anos e graças ao
avanço da medicina.
Retomando a história...
Num dia glorioso, me consultei com um excelente e renomado
neurologista que “cantou a pedra”, pois a nova suspeita era de Epilepsia, após
muitos exames inconclusivos, ECG, Ressonância, Tomografias, todos os tipos de
exames laboratoriais, ele me encaminhou ao seu colega cardiologista que enfim
diagnosticou a Síncope Vasovagal solicitando o Tilt Teste, que acabou por também
confirmou uma Hipotensão Postural.
Fazia faculdade nesta época e já era conhecida como a “Bela Adormecida”,
desmaiava todo dia. Nesta época, grande parte dos professores me adotou e outra
parte me crucificou me aconselhando a desistir, diziam: “Dentista não pode ter
esse tipo de doença”, pode ser que estivessem certos, só que sou dessas que faz
sempre o que duvidam do que posso fazer.
Palpitações e falta de ar no grau que comecei a manifestar
não condiziam com meu diagnóstico de síncope e aí entra o segundo “round” da
luta por novos médicos que confirmassem meu diagnóstico anterior e me
esclarecesse mais algumas dúvidas, mais 2 anos se passaram e o cardiologista do
meu avô detectou uma arritmia maligna, com um simples toque de dedos no seio
carotídeo, denominada Wolf Parkinson White, essa arritmia provém de um feixe elétrico
anômalo que provoca reentrada estimulando descompassadamente o batimento cardíaco.
Encaminhamento para um arritimologista da sua confiança
confirmou o diagnóstico e em duas semanas fiz um procedimento denominado,
Ablação por exame eletrofisiológico, é feito através de um cateterismo onde é
estimulada a eletricidade do coração para conseguir encontrar a profundidade do
feixe anômalo e cauteriza-lo. Foi um sucesso total e já fui liberada no dia
seguinte.
Nova esperança pairava pelo ar, meus pais certos que o pior
tinha passado até comemoraram usando o resultado do exame como prova de
vitória, mas as síncopes e convulsões não cessaram assim como minha qualidade
de vida descia por agua abaixo, tranquei a faculdade por um período, os
traumas, as frequentes paradas nos prontos socorros e a distância dos meus pais
me esgotaram.
PS: médico de pronto socorro não sabe sobre minha condição,
ou seja, era tratada como maluca ou internada sem diagnóstico determinado para
evitar complicações das convulsões.
Bateria de exames novo médico e novas drogas foram sugeridos,
agora também tinha epilepsia associada ao problema cardíaco e uma guerrinha
entre cardiologistas e neurologista para saberem quem estava certo e em fim um
consenso de que eu precisava tratar os dois problemas, anos passei tratando com
neuros e cardiologistas, mais exames, mais drogas, mais efeitos colaterais, e nada.
Cheguei a tomar sete drogas de uma vez, betabloqueador, mais três anticonvulsivantes,
vasopressina, hormônio, eritropoietina injetável e ansiolítico, minha insônia
tinha chegado ao auge.
Nenhuma resposta significativa, minhas restrições pareciam
cada vez mais sem sentido, meus cuidados e remédios não respondiam, me rebelei,
depois de uma vida inteira namorando, desde os 14 anos, namorados diferentes,
mas sempre namorando, estive solteira aos 23 anos no fim da faculdade, na
noitada, viagens e uma necessidade de libertação de uma vida chata regrada e
frustrada, comecei a dirigir mais, a beber de vez em quando, (nunca fui fã), a
ir a Raves, emagreci uns 10 quilos nesse período por desinchar por troca de
medicamentos, pouco apetite e muita agitação.
Já havia retornado a faculdade, ia bem, consegui me formar
com louvor e fazer os melhores estágios possíveis. Voltei pra minha cidade estava
com meu consultório modesto que meu pai por medo de eu levar uma vida acadêmica
e continuar em Niterói estudando fez o favor de comprar uma sociedade pra eu
começar e comecei bem, sempre tive altos e baixos.
Recuperei-me, o tempo passa...conheci meu marido, estava às
voltas com os preparativos do casamento, isso me ajudou muito, casei e a vida a
dois me deu novas responsabilidades e novas frustrações, pioras vieram e num
novo médico que insistiu em um diagnóstico de síndrome do pânico, comecei a
tratar, mais exames, mais drogas, antidepressivos tricíclicos e cheguei ao
fundo do poço, os remédios me fizeram mal, o médico era contra terapia
psiquiátrica e então, depois de um ano percebi que tinha piorado, voltei a me
concentrar na arritmia que depois de 10 anos era o único diagnóstico
consistente.
Novos médicos e excelentes devo muito ao Dr Márcio Kiuchi que
não só me tratou como paciente, mas como amiga. Em setembro de 2012 fui
encaminhada para minha atual cardiologista arritimologista, tem sido muito esclarecedor, novas informações, cuidados e
a esperança de um novo meio de diagnóstico mais claro e preciso.
Minha hipotensão postural foi controlada, parece que tenho
inibição do sistema nervoso periférico que basicamente estimula a contração dos
músculos dos membros inferiores, vasodilatação demais, retorno venoso péssimo, indicação
de malhação e mais drogas pra controlar a “pemba”, só que por uma nova ótica, o
prognóstico é favorável, se fosse deficiência de resposta nervosa central, com
o tempo pararia numa cadeira de rodas sem conseguir engolir, pois os nervos ao
redor de todos os meus órgãos não estimulariam contrações musculares e
irrigação sanguínea necessária.
Uma nova informação que deveria ser animadora existe centros
que tratam minha cardiopatia só com exercícios, sonho meu, mas aqui no Brasil,
só tem em São Paulo e “euzinha” não tenho dinheiro, logo, preciso me drogar
para ter animo de sair de casa, ir ao psicólogo, psiquiatra, malhar e melhorar,
cabeça ruim, corpo ruim, vai por mim, que eu sei bem.
Preciso de acompanhamento periódico, geralmente em uma nova
consulta obtenho mais recomendações, aumento das dosagens da medicação e
prescrição de exames. Em meados de dezembro de 2012 o pedido cirúrgico de um
implante de monitor cardíaco anteriormente recomendado foi feito.
O monitor vem como uma nova oportunidade de diagnóstico de
desmaios inexplicáveis e funciona como um exame invasivo. Infelizmente foi
necessária uma liminar pra obrigar o meu plano a autorizar o procedimento e isto
demandou cerca de 7 meses contando desde a primeira negativa até o cumprimento
do ganho da liminar.
Depois do telegrama enviado pela Unimed informando a
liberação de internação, (pra vocês verem que não minto quanto à demora), num
mundo como este poderiam ter enviado um email né? Mais rápido, não? Em fim...a
cirurgia foi marcada em menos de uma semana, feliz e nervosa fiquei e mais
estressada ainda reagi ao adiamento desta mesma, horas antes da cirurgia por
problemas com o hospital, médico e a chegada do monitor que vem do exterior.
Surtei, fiquei extremamente ansiosa, sem apetite, chorosa,
irritada, desequilibrada mesmo, a expectativa diante de novas respostas e
soluções consequentes desta cirurgia em meses de espera foi se potencializando
a tal ponto que não só eu, como todos os que estão ao meu redor não aguentavam
mais esperar por boas novas.
Felizmente a prorrogação foi marcada para 3 semanas após a
primeira marcação e hoje me recupero da cirurgia com apenas 1 mês de
convalescência, pequenas restrições, muitas visitas, carinho dos amigos e
torcida para um futuro de boas oportunidades.